Alberto Sequeira terá nascido a 29 de Fevereiro de 1964, numa pacata vila localizada no centro do país. O facto de ter nascido no dia 29 de Fevereiro, por si só, fazia dele uma pessoa especial, ou pelo menos invulgar, que é um modo mais modesto de ser especial. Devido à profissão do pai, cedo se viu obrigado a mudar para uma cidade maior, onde passou toda a sua adolescência e início da idade adulta. Acabado o liceu, Alberto prosseguiu os seus estudos na Universidade, onde estudou direito, curso que acabou com excepção apesar de nunca se ter demonstrado verdadeiramente interessado. Lá, tracejou a linha contínua de giz branca algumas amizades, principalmente com pessoas de outras áreas de interesse que não a jurisprudência. Não terá sido de todo propositado, mas tornara-se sem dúvida algo de proveitoso, principalmente em tardes de conversas passados na esplanada do Café da Quebrada, sempre acompanhados da tranquilidade do rio, à esquerda. O Sr. Silva, proprietário do café, já o conhecia, sabendo de antemão o que iria tomar quer viesse sozinho ou acompanhado. Ocasionalmente, Alberto pedia algo de diferente ao Sr. Silva, só para não lhe responder que sim à pergunta “Então, vai ser o mesmo hoje?”, mesmo que o que desejasse fosse o mesmo. As rotinas e hábitos certos incomodavam-no, isto apesar de ele próprio ser uma pessoa de práticas habituais. Enquanto estivera na cidade, e depois de começar a exercer, Alberto vivera sozinho num pequeno apartamento com vista para a Rua Calçada do Oriente. Da sua senhoria, uma senhora viúva que habitava no apartamento contíguo ao seu, apenas conhecia o nome e a sua condição matrimonial. As suas conversas nunca se alongaram muito além da cortesia e boa educação do “Boa tarde minha senhora, como tem passado?”, sendo esta pergunta muitas vezes usada de forma retórica. Ignorava o porquê mas notara que, como a sua, a casa da sua senhoria não era muitas vezes visitada por outros. Actualmente, Alberto deveria andar pelos quarenta e quatro anos, isto apesar de apenas ter festejado onze, ou mesmo menos, aniversários. Digo deveria porque, sem que nada o suspeitasse, há uns meses atrás, Alberto terá desaparecido de modo incompreensível, sendo que mais nada tenha sido descoberto acerca do seu paradeiro. Na quietude dos sues aposentos, meses depois, terão sido encontrados um cinzeiro com um cigarro que fora deixado aceso a consumir-se, com um pequeno manuscrito rasgado por baixo, onde se lia
Os dias consomem-se-me como este cigarro que deixo apagar-se ao sabor do vento; amanhã, se ainda tiver cigarros no meu maço, fecharei a janela.
Na extremidade oposta da mesa poderia ver-se um maço de cigarros amarrotado, deixado esquecido no assoalhado polido da sala.
Os dias consomem-se-me como este cigarro que deixo apagar-se ao sabor do vento; amanhã, se ainda tiver cigarros no meu maço, fecharei a janela.
Na extremidade oposta da mesa poderia ver-se um maço de cigarros amarrotado, deixado esquecido no assoalhado polido da sala.
2 comentários:
Vou acompanhar certamente, pq o texto surpreendeu-me tanto como me prendeu!abraço
obrigado!, fico contente
abraço
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